sexta-feira, fevereiro 27, 2009

LTE ou as bonecas das minhas filhas

Há coisa de uns 10 anos, aconteceu-me uma grande desgraça... o telemóvel apareceu na minha vida e disse: "vim para ficar." Os inícios foram tempos de boicote assumido: recusei comprar um bicho destes pelo menos uns 5 anos; ia “herdando” os aparelhos de gaveta de uns e outros, nalguns a bateria durava para mais de 2 chamadas, em muitos outros não.

O primeiro telemóvel que houve na minha família era um robusto e pesado aparato, marca AEG, que tinha um auricular de corpo inteiro com um cabo destes com caracol que o ligava ao battery-pack e à antena de meio metro. Era pró meu irmão mais velho estar comunicável nos seus estabelecimentos comerciais móveis, aka camiões do pão com chouriço. Pelo caminho, o tamanho e peso destes trastes reduziu-se, no entanto as suas capacidades, funcionalidades e inteligência aumentaram. Hoje conseguem-se colocar muitos milhões mais de transístores no mesmo espaço de há 15 anos atrás.

No congresso da semana passada, falou-se muito de um conceito etéreo chamado LTE; LTE é uma das propostas de implementação do vizinho futuro do telefone móvel, aliás reprodutor de musica, aliás navegador GPS, aliás agenda pessoal, aliás câmara de vídeo, aliás comando de televisão, aliás browser de Internet, aliás computador de bordo do carro, aliás interface dos sensores do forno eléctrico, aliás chaves de casa... Long Term Evolution. A 4ª geração de telemóveis, seja ou não LTE a tecnologia adoptada, estará enredada dos pés à cabeça. A especificações de largura de banda para um aparelho 4G poderão chegar ou até passar os 100Mbps, isto trocado em miúdos quer dizer 100 vezes mais capaz que a ADSL cá de casa!

Isto quer dizer que no futuro todo e qualquer aparelho com um ecrã a cores e umas teclas terá acesso à rede, seja esta a Internet, ou a rede de electrodomésticos lá de casa; poderemos saber se a máquina de lavar está a enxaguar ou a centrifugar neste preciso momento... precisamos mesmo de tudo isto?! O senhores aqueles, donos das suas franjas de mercado acham que sim; porque isto vai permitir aos operadores vender o espaço publicitário de 2 segundos que é a palma da sua mão depois de uma chamada perdida!

Os telemóveis serão um ente mais da comunicação sem fios que vamos viver no futuro; tudo poderá estar conectado. Até as bonecas das minhas filhas (quando as tiver) poderão ter traços faciais on-screen adaptáveis à sua disposição, e as bonecas das amigas das minhas filhas (as que forem compatíveis) poderão adequar a disposição delas de acordo com esse factor. Assim, se a Barbie de Barcelona, estiver triste, a tua em Lisboa poderá contar-lhe uma anedota e assim ela fica mais contentinha. Espero que a boneca me guarde umas palavras de apreço quando no final do mês tenha que pagar a factura dos telefonemas dela.

O turbilhão da tecnologia pode acabar por nos levar muito mais longe do que aquilo que agora podemos só imaginar, e os progressos da robótica e da nanotecnologia ainda nos vão fazer cair o queixo de espanto muitas vezes. Nem mesmo o céu é o limite. Espero que continue a ser válida pró futuro a máxima de que “Quando a tecnologia constrói barreiras, um abraço rebenta com elas!”

Na próxima semana: Caramelos grátis!!!

E os habitais links desta semana:

Ghost in the Shell 2029: Inteligências artificiais com dúvidas existenciais
Ray Kurzweil Futurólogo
MIT's Technology Review na vanguarda da técnica

Foto via Dustbowl

sábado, fevereiro 21, 2009

GSMA World Mobile Congress

Barcelona é uma cidade de congressos, conferências e outros meetings, muitos deles internacionais. Esta semana que passou, deu-se a jóia da coroa dos congressos internacionais da cidade, celebrado aqui desde há 4 anos, o GSMA World Mobile Congress.

A GSMA é uma associação cujos sócios são algumas das maiores corporações do mundo, todas elas ligadas ao negócio das comunicações móveis: Vodafone, AT&T, T-Mobile, Telefónica, Chinamobil são só algumas, entre as da Direcção. Entre o resto dos sócios encontram-se muitas outras de que também já ouvimos falar: Nokia, Samsung, Alcatel, Sony-Ericsson, Microsoft, e uma infinidade de etcéteras! Toda esta minha gente - antenna manufacturers, application developers, chipset builders, data analists, HSPA equipment providers, integrations solutions specialists, global operators, network managers, outsourcers, rural mobile systems specialists, telecommunications authorities, user-interface developers, WLAN integrators - juntam-se em Barcelona, uma vez por ano, para discutir o futuro daquele pedacito de futuro que levamos na mão, do bolso à orelha... o telemóvel!

A cidade muda um bocadinho... aquele edifício que a semana passada dizia Hotel Juan Carlos I, agora tem uma faixa de 24 andares de altura que diz Motorola!!! Aqueloutro Samsung! E em anos anteriores à crise, a rebaldaria era ainda maior; o congresso alugava tudo: discotecas e restaurantes mudavam de dono uma semana inteira. Haviam taxis e autocarros ingleses a circular por aí com HP e Blackberry gravado nas portas. Smarts descapotáveis cor-de-rosa, com duas moçoilas dentro, descapotáveis também elas, uma a conduzir e outra em cima do banco, com auriculares Bluetooth, e subgraves JBL... eu sei lá!

Para felicidade dos técnicos de som, luz, video, decoradores, electricistas e dos riggers, dos hotéis, dos restaurantes, dos bares, dos puticlubs e da Rambla, esta é uma semana de inverno com trabalho: 47,000 inscritos, de 189 países diferentes, num congresso cujo passe vale 600€. 1,400 expositores, 3 deles portugueses: 1 de Coimbra e 2 de Aveiro.

Neste tipo de trabalhos, o técnico de som aborrece-se muito... normalmente há um dia para montar, horas de espera para fazer testes de som e imagem com o cliente, que está em mil reuniões nesse dia, e vai-se para casa. Volta-se no dia seguinte, cedinho, para esperar mais um bocadinho, para voltar a fazer testes com o cliente, com as pilhas novas em todos os micros sem fios, e ouvi-los a falar dos seus numerosos assuntos, com suas numerosas siglas: GSM, GPRS, 3G, HDSPA, LTE, VOIP, WVDMA, WiMAX... tech talk e números! Com o meu inglês em forma, sendo um bocadinho nerd, e aspirante a Engenheiro de Telecomunicações, apanhei muita da conversa para lá das siglas e dos números... coisa que deixo prá semana que vem! Promete...

Para rematar esta, outra ideia... com tanto tempo livre nestes labores de técnico de som de meeting, coffee-break e cocktail, um livro é um bom amigo: devorei 250 páginas d"A Cartuxa de Parma" em 3 dias. Bicho raro, o do livro, no meio tantos PDA's, smart-phones e laptops!!

Next week: LTE, ou as bonecas das minhas filhas!

GSM World GSM Association

Fira Feira Internacional de Barcelona

Teletrofono Inventor: Antonio Meucci... not Graham Bell

domingo, fevereiro 15, 2009

Mercat de Frescs i Encants de Sant Antoni


O mais antigo dos mercados de Barcelona está de parabéns. Cumple 125 anos! Para celebrar a efeméride, boas e más notícias. As más são que o mercado vai fechar; as boas: que não fecha para sempre! Fecha para obras durante 3 anos... apenas se conserva a carcassa: tecto e paredes.

O mercado de Sant Antoni ocupa todo um quarteirão de Eixample (a zona quadriculada da cidade); está desenhado em forma de cruz, alinhada com as diagonais do quadrado do quarteirão, o que faz com que cubra uma superfície enorme, a do maior mercado de Barcelona. Dentro da cruz encontra-se a zona dos produtos frescos: legumes e vegetais, carne e peixe, ovos e aves... na periferia da cruz, do lado de fora, existem umas poucas pequenas bancas que vendem roupa interior, panelas e tachos, botões e tecido ao metro. Às segundas, quartas, sextas e sábados, instala-se à volta do quadrado o mercado d'Encants: vende-se roupa, sapatos, cuecas, ceroilas, panos de cozinha, aventais e outros acessórios de moda.

Ao domingo o mercado fecha, mas este espaço à volta do quadrado que os Encants deixam livre enchem-se de novos e usados: livros, revistas e postais, discos compactos e de vinil, soldadinhos de chumbo, colecções de caricas, jornais velhos, cartuchos de consolas do passado e do presente, cartas de Magic e do Pokemón; é sobretudo uma boa maneira de passar a manhã.

Durante uns tempos, este foi o meu mercado; estava mesmo ao lado de casa quando morava no Raval. No outro dia passei por aqui e dei-me conta que as obras para instalar o mercado provisório estavam em caminho... serão duas tendas gigantes instaladas em plena Ronda de Sant Antoni (leia-se, uma avenida larga) e que albergarão os vendedores de Frescs i Encants durante o tempo que se vai demorar a destruir o interior, fazer um parque de estacionamento, novos armazens e zonas de logística, dois espaços comerciais complementários (leia-se supermercados), restaurantes e sobretudo acabar com o quadrado para deixar a cruz bem à mostra, coisa que fará que este quarteirão ganhe 4 praças triangulares acessíveis ao público em vez de estacionamento de comerciantes.

A obra é grande principalmente porque vai fazer com que o interior acabe todo aproveitado, ao invés de um grande edíficio cheio de galerias com as persianas corridas, e bancas abandonadas, frutos do hiper-consumo e da indiferença da nossa geração.

Carregado de considerável nostalgia, decici fazer a minha "ultima visita" ao mercado, a ver se me inspirava para o tema da semana, e aproveitei para dar uma volta completa ao sítio e comprar umas coisas prós jantares e prós almoços vindouros; deparei-me com uma exposição que aproveitou a efeméride e as bancas desocupadas para contar na primeira pessoa, escritas com pau de giz numa piçarra, as estórias das pessoas e das famílias por detrás dessas bancas vazias... estórias com 70 e 80 anos, da tradição familiar da venda na praça, da fome, do racionamento e da guerra, e da alegria do Natal e dos almoços comuns feitos ali mesmo nos corredores do mercado... (ai se ASAE soubesse).

1 quilo de tomate, 3 courgettes, 1 alho francês, 1 pimento verde, quilo e meio de alcachofras e um raminho de coentros: 5,34€. E da boca do senhor das verduras a certeza de o encontrar debaixo daquele tecto até Setembro.


E na sexta-feira que vem (sem falta): GSM World Barcelona

Remodelació Plano Municipal de Remodelação
Web da Junta Districte Municipal de l'Eixample
Comerciantes Sant Antoni Comerç

sexta-feira, fevereiro 06, 2009

Biblioteca Mercé Rodoreda, Guinardó

Quando cheguei a Barcelona, recém-emigrado, e com dois meses de pé-de-meia para me aguentar enquanto não encontrava trabalho, tive que tratar de uma certa papelada.

Para ser um trabalhador legal em Espanha fazem falta uma série de documentos: o primeiro de todos é o certificado de empadronamento, um documento emitido pela Junta de Freguesia, que comprova que realmente vives onde dizes que vives. Para conseguir el full del padró há que apresentar na junta ou bem um contrato de arrendamento de uma casa, uma factura de algum serviço (água, luz, gás, telefone, etc) ou uma declaração do senhorio em como se é arrendatário da morada tal. Acabei na última opção...

Com o anterior papel, já se pude ir tratar de arranjar um NIE, ou Número de Identificação de Estrangeiro, atribuido pelo Ministério do Interior; para este papel, há que ir à esquadra da Polícia Nacional na Barceloneta, com umas fotografias e uma caneta... preenchem-se mais umas coisas e dias depois volta-se à Barceloneta a buscar uma folha A4 com um carimbo e um número começado por X... Bienvenido a España, chaval! A partir desse momento passei a ser um habitante mais do estado espanhol, com direito a um BI sem foto impresso numa folha A4!

Agora que já conto prá estatística, posso ir à Segurança Social, arranjar mais um número! E assim fiz... fui à delegação do meu bairro, arranquei um número do dispensador vermelho de números, esperei a minha vez e quando finalmente me sentei à frente da senhora disse-lhe, muito convencido: "Me quiero dar de alta en la Seguridad Social". Ao que ela respondeu: "Tu de que trabajas?" Ao que respondi, ainda mais convencido: "De técnico de sonido!" "E ya te has inscrito en los autónomos?" "Qué?!?" OK... ela lá me explicou que tinha que ir primeiro às finanças iniciar uma activade económica e voltar ali com esses papéis. Perguntou-me onde é que eu vivia, e muito amávelmente me disse qual era a oficina que me correspondia.

Fui à delegação da Agéncia Tributária da Horta/Guinardó que é quase no Carmel, e aí me inscreveram como Técnico en Sonido, CAE 221(Código de Actividad Económica), disseram-me para comprar um livro de recibos (não necessáriamente verdes) em qualquer papelaria, mais um livro de despesas e um de ingressos. Assim fiz e voltei à Segurança Social!

Voltei a apresentar-me na Seguridad Social com o meu novo molhinho de papéis e agora sim pude arranjar esse tão desejado novo número, garantia de uma (mínima) protecção social, em caso de acidente laboral, por parte deste meu novo estado... a troco de uma prestação de 180 euros por mês (preço reduzido por ser jovem e ter menos de 5 anos de actividade), quer trabalhasse, quer não! Adios, muy buenas e faça-se à vida... e entre as páginas amarelas arrancadas em Alquiler de equipos de sonido, Audiovisuales, e Espectáculos, as dezenas de telefonemas para saber o nome do jefe a quem enviar o CV e os quilómetros pateados por Barcelona a entregá-los em mão lá encontrei trabalho, em pouco mais de um mês.

Foi pois possível começar a pensar em procurar uma habitación nova para mim e prá minha laranja-metade, e assim deixar de lhe roubar a minúscula metade da cama que ela já alugava no Bairro do Guinardó desde Setembro de 2003, e a que eu me colei em Março de 2004. Passados 3 meses da minha chegada lá conseguimos um quarto numa casa de loucos, baratas e canalizações maradas, na Calle Tallers, num bairro com antiga fama de luzes vermelhas, chamado El Raval, a.k.a El Barrio Chino. Os tempos que se seguiram foram os meses extraordinários da paixão exacerbada pelo centro e pela vida de Barcelona e por esse meu bairro novo que me mudou a vida e o endereço de email!

Do Guinardó, onde agora volto a viver, guardava as boas lembranças desses tempos de incerteza laboral e passeatas burocráticas e dessa coisa fantástica que era a Biblioteca, que tinha montes de CD's que podias levar para casa (4) durante uma semana inteirinha... e onde tantas tardes e noites passei a ler manuais de PA's e mesas de som enquanto a minha princesa se preparava para mais uma época de exames de selectividade, a ver se finalmente entrava em Medicina. Foi o cartão dessa biblioteca, com apenas necessidade do meu BI português, o meu primeiro documento oficial espanhol!

Foi talvez por me sentir tão em casa na Biblioteca Mercé Rodoreda, que ontém a resolver integrais com os phones postos, me chegou este bilhetinho...

Na semana que vem: Mercat de Sant Antoni

biblioteca Biblioteca Mercé Rodoreda
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